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Divergência ainda trava mudança na Lei de Informática

Imagem - Divergência ainda trava mudança na Lei de Informática

A dois meses do prazo definido pela Organização Mundial do Comércio (OMC), o governo tem ainda pelo menos uma divergência interna que impede a mudança exigida na Lei de Informática.

Condenado em processo movido pela União Europeia e pelo Japão, o Brasil tem até o fim deste ano para revisar os incentivos a fabricantes de computadores, celulares, tablets e outros equipamentos de tecnologia. Hoje eles têm desconto de 80% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) quando cumprem requisitos para fazer investimentos em pesquisa e desenvolvimento no país. O programa dura até 2029.

Nos últimos dias, um impasse em torno dos benefícios fiscais foi superado e permitiu avanços na redação de uma medida provisória. A Receita queria restringir o uso de créditos tributários pelas empresas de tecnologia apenas ao Imposto de Renda (IRPJ) e à Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). A indústria alegava que, na prática, isso anularia o incentivo porque muitas companhias não têm resultado suficientemente positivo para fazer o abatimento integral.

Segundo fontes oficiais, houve acordo no governo e os créditos gerados poderão ser utilizados em todos os impostos e tributos federais, desde que as companhias declarem IRPJ por lucro real – não por lucro presumido. Isso poderia afetar de 60 a 70 empresas pequenas e médias, mas preservaria o grosso das 600 beneficiadas atualmente. Esse abatimento custa cerca de R$ 6 bilhões anuais aos cofres públicos.

O ponto que ainda gera conflito é a aplicação dos benefícios. A vontade do ministro da Economia, Paulo Guedes, é “desmamar” a indústria e eliminar gradualmente os incentivos. Todos concordam em manter a vigência do programa até 2029, sem descontinuidade para quem já faz uso do mecanismo, porque veem risco de judicialização. A jurisprudência dos tribunais superiores, afirma uma fonte próxima do ministro, vai no sentido de reconhecer o “direito adquirido” das empresas que fizeram investimentos pesados contando com a validade das regras.

No entanto, essa ala mais “formuladora” de políticas públicas na equipe econômica prefere fechar as portas para novos entrantes na MP. Ou seja, quem já usufrui dos benefícios, continuaria sendo contemplado (com as adaptações na lei); quem pretende gozar dos mesmos incentivos, não poderia mais. Uma forma, segundo o grupo de Guedes, de não estender um mecanismo que classificam como inadequado.

O problema é que já houve alertas contrários de outras alas do governo, incluindo a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que fica na Economia. A tese é que empresas do mesmo setor e produtoras dos mesmos bens não podem pagar impostos diferentes. Diante do impasse, a Casa Civil e a Secretaria-Geral da Presidência (onde está agora a Subchefia de Assuntos Jurídicos) deverão arbitrar sobre o assunto.

“É vedado tratamento tributário desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente”, afirma o deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP), ex-ministro do Desenvolvimento e atual vice-presidente da Câmara, citando o artigo 150 da Constituição. Para ele, impedir que novas empresas de tecnologia se beneficiem dos créditos gerados pela Lei de Informática seria medida totalmente ilegal.

Junto com outros três parlamentares, Pereira apresentou um projeto de lei (PL 4.805/19) que também trata do tema. “A nossa preocupação é ter, a partir de 1º de janeiro, uma legislação incompatível com as regras da OMC e retardar investimentos no setor.”

No início, conforme explica um executivo do setor, o sentimento da indústria era de que o PL serviria como forma de “apressar” o governo para a publicação de uma MP. Como uma solução foi sendo adiado, agora as empresas preferem resolver pelo projeto de lei. Ontem saiu parecer favorável do relator, André Figueiredo (PDT-CE), e 17 líderes de partidos assinaram requerimento para tramitação com “urgência urgentíssima”.

Se a maioria absoluta aprovar, o relatório entra na ordem do dia da mesma sessão. Com isso, na visão da iniciativa privada, poderia ter desfecho mais rápido até do que uma medida provisória. Como mudanças em questões tributárias exigem “noventena” (período de 90 dias) para implementação efetiva, o prazo dado pela OMC não será cumprido rigorosamente.

Ninguém no governo brasileiro avalia que a UE ou o Japão seria tão intolerante com esse pequeno estouro, se a solução estiver encaminhada. Se a indefinição continuar, porém, europeus e japoneses teriam direito de pedir direito de retaliação – na forma de aumento das tarifas de importação contra produtos brasileiros em geral.

Na semana passada, o embaixador da UE em Brasília, Ignacio Ybáñez, ressaltou a importância de respeitar os compromissos da OMC, mas disse perceber “boa vontade” do governo em fazer os ajustes necessários.

Fonte: Valor Econômico

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