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Lei de Informática: Uma visão geral sobre o incentivo no setor de TIC

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Com o advento de novas tecnologias e buscando aumentar a capacitação e a competitividade do setor de informática e da automação, em 1991, o governo federal brasileiro publicou a Lei nº 8.248, a qual concede incentivos fiscais às empresas que exercem atividades de desenvolvimento ou produção de bens de tecnologia da informação e comunicação (TIC) e investem em atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação no setor. Tal ação conferiu alto grau de investimento, permitindo a inserção internacional dos demais setores industriais brasileiros, assim como se tornou um instrumento decisivo para atrair a manufatura eletrônica para o território nacional. Além disso, o benefício fiscal principal, que foi baseado originalmente na redução da alíquota do IPI no momento do faturamento dos produtos, permitiu uma redução no preço dos equipamentos produzidos nacionalmente em comparação aos produzidos internacionalmente.

Ao longo dos anos, com o surgimento de tecnologias disruptivas, a Lei de Informática passou por atualizações e novas regulamentações, como por exemplo o Decreto nº 5.906, o qual definiu os principais conceitos e requisitos para usufruir dos benefícios da legislação, e a Lei nº 13.969/19, que alterou a forma do incentivo fiscal para as fabricantes de bens de tecnologia da informação.

Tendo como principal pilar da política de informática o vínculo entre estímulos fiscais (Governo Federal, órgãos e autarquias), produção local (fabricantes) e investimentos em pesquisa e desenvolvimento – P&D (ICT, instituições de ensino e pesquisa, entre outros), a Lei de Informática já possibilitou uma renúncia fiscal de aproximadamente R$ 48 bilhões entre 2006 e 2017, além do número de indústrias correlacionadas ao setor, que ultrapassou a marca de 500 empresas no ano de 2019. Como forma de contrapartida, os investimentos das empresas em P&D somaram R$ 12,4 bilhões no mesmo período (2006 a 2017), gerando um verdadeiro ecossistema em prol da inovação tanto internamente nas fabricantes dos bens e serviços de TIC quanto aos 404 institutos de pesquisa e desenvolvimento, instituições de ensino e incubadoras credenciadas pelo Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação (MCTIC) no ano de 2020. Conforme uma pesquisa realizada pela Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica), de todas as instituições credenciadas no Ministério, aproximadamente 33% estão localizadas nas regiões Norte, Nordeste ou Centro-Oeste do país, o que demonstra a preocupação do poder público no desenvolvimento de todas as regiões do país.

Principais Conceitos

De forma a nivelar o conhecimento quanto ao assunto, dentre os principais conceitos apresentados na legislação pertinente ao tema, destacam-se:

  • Aquisições Incentivadas: São os insumos e matérias-primas adquiridas em mercado nacional por fabricantes que cumprem o PPB, sendo estes adquiridos com incentivos de redução/isenção de IPI;
  • Bens e serviços de tecnologia da informação e comunicação: são os itens passíveis de fruição do benefício da Lei de Informática, dentre os quais se destacam:
    • componentes eletrônicos baseados na tecnologia de semicondutores;
    • máquinas, equipamentos e dispositivos baseados em técnica digital para processamento de dados;
    • programas para computadores (software);
    • serviços técnicos relacionados aos bens elencados acima.
  • FNDCT: O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) possui natureza contábil e tem como objetivo financiar a inovação e o desenvolvimento científico e tecnológico, visando promover o desenvolvimento econômico e social do país;
  • ICT: As Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICT) são organizações sem fins lucrativos de administrações públicas ou privadas, que possuem como principal objetivo a criação e o incentivo de pesquisas científicas e tecnológicas;
  • Plano de P&DDocumento solicitado pelo MCTIC para o processo de habilitação da empresa e seus produtos, no qual constam informações acerca de previsão de faturamento, propostas de projetos em P&D e parcerias com instituições de ensino e pesquisa;
  • Processo Produtivo Básico (PPB): conjunto mínimo de operações, no estabelecimento fabril, que caracteriza a efetiva industrialização de determinado produto, consistindo nas etapas fabris mínimas necessárias para o produto ser caracterizado como beneficiável na Lei de Informática;
  • RDA: O Relatório Demonstrativo Anual (RDA) é um documento de caráter obrigatório no qual constam os demonstrativos de cumprimento das obrigações legais, apresentando as atividades e dispêndios de P&D realizadas pela empresa; 
  • Tecnologia desenvolvida no país: produtos de informática e automação desenvolvidos e fabricados conforme o PPB, com suas principais funcionalidades concebidas, desenvolvidas e testadas por técnicos de comprovado conhecimento em laboratórios localizados em território nacional.

Como conseguir o benefício

Primeiramente, a empresa que possui interesse em aproveitar o benefício deve atender aos seguintes requisitos:

  • Estar sob o regime de apuração no lucro real ou lucro presumido, sendo adicionalmente necessário no segundo caso a apresentação da escrituração contábil, nos termos da legislação vigente;
  • Possuir regularidade fiscal, tanto nas obrigações relacionadas à Receita Federal quanto na Previdência Social;
  • Possuir seu produto enquadrado nas NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul) contidas na Lei, bem como cumprir o PPB dos produtos incentivados, atendendo as metas estabelecidas pelo MCTIC.

Não obstante, as empresas devem realizar o cadastro e solicitar a habilitação provisória de seus produtos por meio de um sistema específico, vinculado à Secretaria de Política de Informática – SEPIN, sendo de extrema importância a participação de especialistas técnicos, principalmente no preenchimento e redação do plano de P&D, assim como a caracterização dos produtos e modelos a serem habilitados, inclusive quanto à sua classificação NCM, pois qualquer discrepância ou ausência nas informações prestadas pode ocasionar o indeferimento do pleito, inviabilizando esse atalho para a inovação empresarial.

Existem atualmente duas formas de habilitação distintas na legislação de incentivo ao setor de tecnologia da informação e comunicação (TIC), sendo a primeira a habilitação provisória, que possui um prazo máximo de 90 dias para emissão (publicação de portaria em Diário Oficial que permite a empresa usufruir do incentivo) e incorre na impossibilidade de inclusão de modelos. Já a habilitação definitiva, que não possui um prazo para emissão e pode ocorrer em qualquer época do ano, tornando a habilitação provisória inválida, não possui limitante para a habilitação de novos produtos e modelos.

Ressalta-se também que, além do benefício direto possibilitado a partir do momento de habilitação da empresa no MCTIC, a Lei de Informática ainda possui benefícios indiretos os quais a fabricante de bens de serviços de tecnologia da informação pode se beneficiar, como por exemplo a possibilidade de incentivos sobre o recolhimento de ICMS (conforme o estado), preferência na participação de licitações governamentais e cadastro diferenciado dos produtos no FINAME.

Investimento em PD&I

Como forma de contrapartida aos incentivos fiscais homologados para utilização por parte das empresas que exerçam atividades de produção de bens e tecnologias da informação e comunicação habilitadas pelo MCTIC e cumpram o PPB em seus produtos, a legislação prevê a obrigatoriedade de investimento anual em PD&I de um total de 4% de todo o faturamento desses produtos incentivados em atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação no setor de TIC, cuja distribuição pode ser da seguinte maneira:

Nesse sentido, cabe ressaltar que os investimentos poderão ser realizados também sob a forma de aplicação em programas e projetos de interesse nacional nas áreas de TIC, considerados como prioritários pelo poder público.

Ademais, ao longo dos anos, pode-se observar uma mudança significativa no perfil de investimento por parte das empresas habilitadas na lei, pois inicialmente estas investiam apenas o mínimo previsto na legislação para o cumprimento dos requisitos de fruição do benefício. Todavia, nos últimos anos, as empresas perceberam que podiam usar de maneira eficaz os recursos mobilizados pela Lei de Informática, resultando tanto em benefícios para a própria empresa quanto ao desenvolvimento tecnológico do país, com a consolidação de grandes institutos de pesquisa e universidades públicas e privadas do país.

Conflito com a OMC

Em junho de 2015, a União Europeia e o Japão questionaram, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) algumas medidas tributárias brasileiras, e entre elas, estava a Lei de Informática. Alegou-se que os benefícios fiscais e tributários existentes na legislação brasileira violavam acordos da OMC, sendo o primeiro o que proíbe tratamento tributário diferenciado para produtos nacionais e importados, e o outro que proíbe subsídios vinculados ao uso de conteúdo local (o que ficou conhecido como o PPB do PPB). O resultado da etapa inicial do processo resultou na condenação do Brasil, exigindo a imediata revogação dos incentivos brasileiros.

Após recurso por parte do governo brasileiro, no fim de 2017, no âmbito do Órgão de Apelação da OMC, o Brasil conseguiu reverter algumas determinações que haviam sido impostas no processo, restringindo o alcance das determinações previstas inicialmente. Contudo, a OMC ainda exigiu a alteração da legislação e forma de cumprimento do PPB nos produtos habilitados e fabricados nacionalmente. O prazo definido para tal adequação foi 31 de dezembro de 2019, exigindo um esforço coletivo para a definição da nova legislação, atendendo às demandas do órgão, mas ao mesmo tempo mantendo as conquistas alcançadas. Como resultado desse processo fora publicada a Lei nº 13.969/19, que alterou a forma de incentivo fiscal, conforme apresentado a seguir.

Mudanças na Legislação

Para atender aos requisitos impostos pela Organização Mundial do Comércio e não sofrer sanções econômicas, o Governo Federal propôs alterações na Lei de Informática, que após diversos estudos, análises e discussões, resultou na publicação em Diário Oficial da União no dia 27 de dezembro de 2019 a Lei nº 13.969, alterando a lei original (8.248/91), especialmente na tipologia do benefício fiscal, que passou a ser baseado na geração de créditos fiscais que poderão ser utilizados para abatimento de impostos regidos sob os preceitos da Receita Federal do Brasil (RFB), em substituição ao modelo de redução direta do IPI no momento da comercialização do produto.

Inclusive, a nova lei modificou outros aspectos, como por exemplo, a revogação da redução adicional na obrigação de investimento existente para os fabricantes de microcomputadores portáteis e unidades de processamento digital de pequena capacidade (tornando a obrigação de 4%, independentemente do tipo ou aplicação do bem ou serviço), assim como a inclusão dos gastos com infraestrutura física e de laboratórios de ICT como dispêndios elegíveis para cumprimento da obrigação do PD&I.

Expectativas Futuras

Por fim, a expectativa dos fabricantes de bens e serviços do setor de TIC em solo nacional é pelo constante aperfeiçoamento dos incentivos fiscais, incluindo novas regulamentações e estratégias, transformando esse arcabouço legal em um instrumento que permita às indústrias e aos investidores traçar estratégias de longo prazo, investindo no desenvolvimento de novas tecnologias, produtos e serviços, como já vem ocorrendo ao longo desses anos, pois a Lei de Informática representa uma plataforma poderosa para que o Brasil possa protagonizar um papel importante no novo cenário tecnológico mundial.

Desenvolvido por André Gustavo Weber, Analista de Produtos no FI Group.

Publicado em Câmara Espanhola.

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